quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Ocultismo Prático - Trecho



Segue um bela mensagem da Mestra Helena Petrovna Blavtsky
Aprende que não há cura para o desejo, que não há cura para a busca de recompense, que não há cura para o sofrimento de estar ansioso por algo, a não ser fixando a visão e a audição naquilo que ‘e invisível e inaudível.
O homem tem de acreditar na sua capacidade inata de progredir; não deve se atemorizar ao considerar a grandeza de sua natureza superior nem se deixar arrastar pelo seu eu inferior ou material.
Todo o passado nos mostra que as dificuldades não devem servir de desculpa para o desanimo, muito menos para o desespero, de outro modo o mundo não teria as muitas maravilhas da civilização.
A força de vontade para seguir adiante ‘e a primeira necessidade daquele que escolheu seu caminho. Onde pode ela ser encontrada? Olhando-se ao redor não ‘e difícil ver onde outros homens encontraram sua força. A sua fonte ‘e a convicção profunda.
Abstém-se porque ‘e correto o abster-se – não para te conservares limpo.
O homem que luta contra si mesmo e vence a batalha só pode fazê-lo quando sabe que naquela luta ele está fazendo aquilo que vale a pena ser feito.
“Não resistas ao mal”, isto ‘e, não te queixes nem te irrites com as vicissitudes inevitáveis da vida. Esquece de ti mesmo (servindo aos outros). Se os homens maltratam, perseguem ou enganam os seus semelhantes, por que resistir? Na resistência criamos males ainda maiores.
O trabalho imediato, qualquer que seja, tem implícito o clamor do dever, e a sua relativa importância ou não-importância não deve ser, em absoluto, considerada.
O melhor remédio para o mal não ‘e a repressão, mas a eliminação do desejo, e isso pode ser melhor alcançado mantendo-se a mente constantemente fixa em coisas divinas. O conhecimento do Eu Superior ‘e solapado quando se deixa a mente comprazer-se com os objetos dos sentidos desgovernados.
Nossa própria natureza ‘e tão vil, orgulhosa, ambiciosa, e tão cheia de seus próprios apetites, julgamentos e opiniões, que se as tentações não a dominassem, ela se deterioraria irremediavelmente; portanto somos tentados até o fim para que possamos conhecer a os mesmos e ser humildes. Sabe-se que a maior das tentações ‘e não ter tentação alguma, por esse motivo alegra-te quando elas te assaltarem, e com resignação, paz e constância, resiste a elas.
Sente que tu não tens que fazer nada para ti mesmo, mas que certas tarefas são designadas para ti pela Divindade, as quais tu tens que cumprir. Deseja Deus, e não algo que Ele possa proporcionar-te.
HPB

Tudo o que deva ser feito, tem de ser feito, mas não com o propósito de satisfazer-se com o fruto da ação.
Se todas as ações de uma pessoa forem executadas com a plena convicção de que não tem qualquer valor para o agente, mas que devem ser efetuadas simplesmente porque tem de ser feitas – em outras palavras, porque está em nossa natureza agir – então a personalidade egoísta em nós se enfraquecera cada vez mais, até que chegue a apaziguar-se, permitindo ao conhecimento revelar o Eu Verdadeiro a brilhar em todo seu esplendor. Não se deve permitir que a alegria ou a dor afaste a pessoa de seu firme propósito.
Até que o Mestre te escolha para vir a Ele, esteja com a Humanidade, trabalhando de modo altruísta pelo seu progresso e evolução. Somente isto pode trazer verdadeira satisfação.
O conhecimento aumenta na proporção de seu uso – isto ‘e, quanto mais ensinamos mais aprendemos. Portanto, Buscador da Verdade, com a  de uma criancinha e a vontade de um Iniciado, compartilha daquilo que tens com aquele que nada possui para conforta-lo em sua jornada.
Um discípulo tem de reconhecer de maneira inequívoca que a própria ideia de direitos individuais nada mais ‘e que a manifestação da natureza venenosa da serpente do eu. Ele jamais deverá considerar outro homem como alguém passível de ser criticado ou condenado, nem tampouco poderá o discípulo elevar sua voz em autodefesa ou desculpa.
Nenhum homem ‘e teu inimigo; nenhum homem ‘e teu amigo. Todos são igualmente teus instrutores.
Não mais se deve trabalhar para ganhar benefício, temporal ou espiritual, mas tão somente para cumprir a lei da existência que ‘e a justa vontade de Deus.”

Trecho retirado do livro Ocultismo Prático.

terça-feira, 29 de julho de 2014

Frustrações Nossas de cada dia.


Hoje estamos em uma mundo, onde cada vez mais, se procura satisfazer a vida, ser feliz, VIVER O MOMENTO, mas ao mesmo tempo, parece que nunca estivemos tão frustados.

Pouca paciência no trânsito, com as crianças, no trabalho, enfim em qualquer lugar que estejamos parece que a síndrome da falta de paciência nos acompanha. E oque será que gera essa frustração interior? Será a falta de dinheiro para satisfazer nossos desejos matérias? a falta de um sentido de vida? ou simplesmente vivemos uma época de pessoas "fragilizadas" egoístas e vaidosas?

Carlos Castaneda (1925 - 1998)
Carlos Castaneda, escrito peruano, criou um personagem chamado Don Juan, que na verdade é um bruxo de origem indígena que o mesmo conheceu no deserto do México.Don Juan inicia Carlos Castaneda nos mistérios da vida e faz com que o mesmo enxergue a existência de um ponto de vista mais espiritual e buscando sempre uma evolução consciencial. Vamos ver abaixo oque o autor tem a nos ensinar sobre as frustrações e sua origem.


Místico Don Juan


Em O PODER DO SILÊNCIO, dom Juan explicar que "durante nossas vidas ativas nunca temos a chance de ir além do nível da mera preocupação, porque desde tempos imemoriais a rotina dos afazeres diários nos entorpeceu. É apenas quando nossas vidas quase se encontram por terminar que nossa preocupação com o destino começa a assumir um caráter diferente. Começa a fazer-nos ver através da neblina das ocupações diárias".

Ainda quando buscamos vivenciar na prática o ensinamento de alguma religião, mantemos o hábito subconsciente de "arranjar" nossas conclusões de modo que elas se encaixem em nosso esquema de complacências, isto é, o conjunto de auto justificativas  pelas quais explicamos a nós mesmos nossa lentidão e preguiça na busca da verdade e em nossas tentativas de viver impecavelmente.

Quando nos irritamos com erros alheios, trata-se muitas vezes de uma válvula de escape da frustração que temos reprimido em nós diante do nosso próprio comportamento insatisfatório.

Frequentemente o erro de outra pessoa provoca um alívio na consciência pesada do ser humano espiritualmente preguiçoso.

Por outro lado, alguém que procure prejudicar-nos seriamente pode ser extremamente valioso como "pequeno tirano". Seu valor decorre do fato de que entre os maiores inimigos do guerreiro da sabedoria estão a vaidade e a auto-importância.

Quando uma pessoa visa prejudicar-nos de modo consciente e intencional, temos uma oportunidade ímpar de observar nosso próprio orgulho, nossa raiva, nossa frustração e nossa ingenuidade. São muitas as caras da auto-ilusão. Um "pequeno tirano" que tenha condições de colocar o guerreiro em risco e prejudicá-lo seriamente presta um serviço enorme e acelera o processo de auto-observação e purificação do buscador da verdade.

Carlos Castaneda, nos ensina a ver a vida como uma grande pedagogia, sem "mentalidade de vítima" e de buscadores de nós mesmos, entender que na verdade essas frustrações vem do fato de ainda não realmente acreditarmos que o sentido de vida está em nosso crescimento interno e na capacidade de se fazer crescer em cada dia e situação, ainda confundimos com coisas externas como bens materiais ou reconhecimento e aceitação. Criamos e "gostamos" desses pequenos tiranos e como a história nos ensina, onde existe tirania não existe liberdade.

Realmente como seres humanos buscamos a felicidade e a liberdade e segundo os ensinamentos de Don Juan elas estão dentro de nós quando realmente nos propomos a olhar, daí nos podemos perguntar..."Isso é difícil? isso é complicado? Se essa buscar for o verdadeiro sentido da vida porque da uma sensação de medo e insegurança?". Sim dá medo, mas quem não tem medo do desconhecido? e si aventurar ao desconhecido, esse sentimento só os homens livres podem ter.

Edmilton Furtado.

quinta-feira, 24 de julho de 2014

Onze Aforismos da Tradição Judaica

Onze Aforismos da Tradição Judaica

Texto original publicado por HPB na revista “The Theosophist” em 1885.



1) Nunca morre aquele que vive pela sabedoria.  

É imortal aquela  parte do ser humano que vivencia o conhecimento eterno.

2) O coração é o tesouro oculto do ser humano.

Está no coração o único templo verdadeiro. 

3) A sabedoria é uma árvore que cresce no coração.

E esta árvore deve crescer até que, como é da sua natureza,  dê frutos sem nada esperar em troca.

4) Reduzir o alimento prejudicial é melhor do que comer alimentos que fazem bem. 

Este princípio vale tanto para os alimentos físicos como para os alimentos emocionais e mentais.



5) Se você não pode obter o que deseja, fique satisfeito com aquilo que não precisa desejar. 

Uma  vida simples elimina as fontes de preocupação e sofrimento.

6) Não há riqueza comparável ao contentamento.

A felicidade está em nada desejar pessoalmente.

7) Um herói só se mostra em época de desgraças.

É diante das dificuldades que se revela o verdadeiro caráter de alguém.

8) O caminho para o Éden é difícil, mas os caminhos para Tope (o inferno) são fáceis.

 Muitas vezes o que é bom não é agradável e, freqüentemente, o que é agradável não é bom. O Éden e o inferno são imagens simbólicas: indicam estados de espírito vividos pela alma humana durante a vida física, e também entre duas encarnações.

9) Nenhuma crítica surtirá efeito sobre aquele que não critica a si mesmo. 

Sábio é aquele que aprende com seus erros.

10) Não é correto que um homem lamente o que perdeu. Ao invés disso,  deve cuidar bem daquilo que ainda permanece com ele.

O desapego, a perseverança e a responsabilidade são três princípios básicos para levar uma vida correta.

Sem Lamentações


11) Se quiser associar-se a alguém, mostre ao indivíduo um erro cometido por ele. Se reconhecer o erro, ele é confiável. Caso contrário, deixe-o de lado.  

A verdadeira amizade só pode ocorrer quando não há uma casca externa feita de orgulho e aparências. Como destacou Marco Túlio Cícero, a amizade não pode ser uma cumplicidade visando beneficiar interesses egoístas.



Texto Original no Site: Filosofiaesoterica

terça-feira, 22 de julho de 2014

O Caminho Elegante do Guerreiro

O caminho elegante do Guerreiro.

O Guerreiro caminho de maneira elegante pela Vida.  Não como forma de afetação mas como fruto de um laborioso trabalho de polimento das hostilidades de sua personalidade; indo do sangrento combate interno, da pedra rígida e cheia de pontas para a polida e brilhante pedra preciosa.

Lancelot do Lago.


A elegância é a expressão da conquista da Luz interior do guerreiro, que se manifesta como brilho no semblante nobre e sereno do seu rosto.


O Caminho elegante do guerreiro não é um rebusque de forma e linguagem, mas a simplicidade não fundamentada em modas presentes ou pretéritas. É o sonho de todo o guerreiro, mesmos aqueles guiados pela sua violência! Ainda que não o saibam! A Elegância é a Paz na Ação, a atitude pensada, a postura justa e bela. A Ação pelo BEM, pois o guerreiro se esmerila, mas nunca para.
O Caminho do Guerreiro é a simplicidade.


Texto de Ted Vale

Obrigado por enriquecer nosso Blog.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

O Egito sob o Olhar de Napoleão.

O Egito sob o Olhar de Napoleão no Pará.

Deusa Nut


Após passar por Brasília e Fortaleza, a exposição O Egito sob o Olhar de Napoleão, na Coleção Itaú chega ao Museu de Arte de Belém, no Pará. A mostra, que conta com a curadoria de Vagner Porto, acontece entre os dias 16 de maio e 10 de agosto de 2014.
Esfinge como foi encontrada pelos soldados de Napoleão.

Organizada em cinco seções (Cartografia, Religião, Arquitetura, Egito Moderno e História Natural), a exposição traz gravuras, algumas com mais de 1 metro de altura, e uma seleção de 13 volumes da obra Description de l’Égypte – que descreve a expedição científica e militar liderada pelo general Napoleão Bonaparte, reconhecida como o mais importante estudo erudito europeu sobre o Egito antigo e moderno.
Vista interna - Templo de Tebas

A mostra conta ainda com um dos exemplares produzidos por Dominique Vivant Denon, com a cronologia dos principais eventos da campanha napoleônica e 13 telas com imagens dos livros, que podem ser manuseadas pelos visitantes.

Ao percorrer essas fascinantes gravuras podemos ter duas boas percepções. A grandiosidade que foi o Egito, com seus monumentos e suas obras que até hoje nos causam a sensação de mistério e de não conseguir compreender em totalidade como eles conseguiram ser tão eficientes como civilização não apenas no aspecto físico mais moral e religioso. A outra impressão é o espanto de boa parte da comitiva de Napoleão não somente por encontrar tanto fascínio e precisão nas obras que nos restaram conhecer mas em especial, por sentir que um dia fomos grandes e que agora não passávamos de  monumentos decaídos. A paixão com que foi desenhado e narrado essa aventura no Egito são realmente inspiradoras.
O Egito sob o Olhar de Napoleão, na Coleção Itaú
sexta 16 de maio a domingo 10 de agosto de 2014
terça a sexta, das 10h às 18h
sábado, domingo e feriados, das 10h às 21h

Museu de Arte de Belém
Praça D. Pedro II, s/nº – Cidade Velha – Belém – PA

agendamento de grupos: 91 3114-1028 – setor de gestão educacional
Entrada franca

terça-feira, 1 de julho de 2014

O Grande Paradoxo

O Grande Paradoxo

Viver no Eterno e Vigiar o que é Momentâneo


Helena P. Blavatsky
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O texto abaixo foi publicado pela primeira vez
em 1887. É traduzido de “Collected Writings of
H.P. Blavatsky”, TPH, India/USA, volume VIII,
pp. 125-129. Título original: “The Great Paradox”.

Alguns estudantes consideram “O Grande Paradoxo”
um dos textos mais importantes da filosofia esotérica.

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O paradoxo parece ser a linguagem natural do Ocultismo.  Mais do que isso, ele parece penetrar profundamente no coração das coisas, e assim parece ser inseparável de qualquer tentativa de colocar em palavras a verdade, a realidade que está na base das aparências externas da vida.

E o paradoxo acontece não somente nas palavras, mas na ação, na própria conduta da vida. Os paradoxos do ocultismo devem ser vividos, não falados apenas. Aqui reside um grande perigo, porque é muito fácil perder-se na contemplação intelectual do caminho, e assim esquecer-se de que a estrada só pode ser conhecida quando se caminha por ela.

Um paradoxo assustador se apresenta ao estudante já no início e o confronta assumindo novas e estranhas formas em cada curva do caminho. Talvez esse estudante tenha procurado o caminho desejando uma orientação, uma regra sobre o que é certo para a conduta em sua vida.

Ele aprende que o alfa e o ômega, o começo e o final da vida é altruísmo; e ele sente a verdade da afirmação de que somente na profunda inconsciência do autoesquecimento a verdade e a realidade do ser podem revelar-se ao seu coração sedento.

O estudante aprende que esta é a lei única do ocultismo, ao mesmo tempo a ciência e a arte do viver, o guia para a meta que ele deseja alcançar. Ele está cheio de entusiasmo e entra bravamente na trilha da montanha. Então ele descobre que seus instrutores não encorajam seus voos ardentes de sentimento, seu anseio pelo Infinito que o faz esquecer de tudo - no plano externo e factual de sua vida e sua consciência. Pelo menos, se não eliminam seu entusiasmo, eles lhe apontam, como primeira e indispensável tarefa, vencer e controlar seu corpo. O estudante descobre que, longe de ser encorajado a viver nos pensamentos sublimes de seu cérebro e fantasiar que alcançou o éter onde está a verdadeira liberdade - com o  esquecimento de seu corpo, suas ações exteriores e sua personalidade - a ele são atribuídas tarefas muito mais terrenas. Toda a sua atenção e vigilância são requeridas no plano exterior; ele não deve nunca se esquecer de si mesmo, nunca descuidar de seu corpo, sua mente, seu cérebro. Ele deve aprender a controlar a expressão de cada detalhe, verificar a ação de cada músculo, dominar o mais leve movimento involuntário. A vida diária à sua volta e dentro dele mesmo é assinalada como objeto do seu estudo e da sua observação. Em vez de esquecer o que geralmente é chamado de banalidades, pequenos descuidos e erros acidentais da língua e da memória, ele é forçado a tornar-se, a cada dia, mais consciente desses lapsos até que, finalmente, eles parecem envenenar o ar que ele respira e sufocá-lo; até que ele parece perder a visão,  e o contato,  com o grande mundo de liberdade pelo qual está lutando;  até que cada hora e cada dia parecem cheios do amargo sabor do eu,  e seu coração sente-se doente com a dor e a luta do desespero.  E a escuridão fica ainda mais profunda porque a voz interior grita incessantemente: “Esqueça de si mesmo. Cuidado, do contrário você se torna autocentrado -  e a erva gigante do egoísmo espiritual firmemente se enraizará em seu coração; cuidado, cuidado, cuidado!”

A voz leva seu coração até suas profundezas, porque ele sente que as palavras são verdadeiras. Sua batalha diária e contínua o ensina que estar autocentrado é a fonte do sofrimento, a causa da dor, e sua alma está cheia de desejo de liberdade.

Assim, o discípulo é tomado pela dúvida. Ele confia em seus instrutores, porque sabe que através deles fala a mesma voz que ele ouve em seu coração. Mas agora eles dizem palavras contraditórias; a voz interna, a única, recomenda esquecer de si mesmo totalmente, em prol da humanidade; a outra, a palavra falada por aqueles de quem ele busca orientação, recomenda primeiro dominar seu corpo, seu eu exterior.  E a cada hora ele vê mais claramente como é difícil aquela batalha com a Hidra, e vê sete cabeças crescerem novamente no lugar de cada uma que ele decepou.

No começo ele oscila entre as duas coisas, ora obedecendo a uma, ora obedecendo à outra. Mas logo ele aprende que isso é infrutífero. Porque o sentido de liberdade e leveza que no princípio vem quando ele deixa seu eu externo sem vigilância para que possa procurar internamente ar puro, logo perde sua intensidade e um choque repentino lhe revela que ele escorregou, e caiu, no caminho que vai montanha acima. Então, em desespero, ele se lança sobre a traiçoeira serpente do eu e luta para sufocá-la até a morte; mas seus anéis espiralados, sempre fugidios, evitam suas mãos; as tentações insidiosas de suas escamas brilhantes cegam sua visão e, novamente, ele se envolve no turbilhão da batalha que o vence dia a dia e que, finalmente, parece preencher o mundo inteiro e apaga tudo o mais, exceto sua consciência.

Ele está cara a cara com um paradoxo esmagador, cuja solução deve ser vivida antes que possa ser realmente entendida.

Em suas horas de meditação silenciosa, o estudante descobrirá que há um espaço de silêncio dentro de si, em que ele pode se refugiar dos pensamentos e desejos, do turbilhão dos sentidos, e das ilusões da mente. Mergulhando sua consciência profundamente em seu coração, ele pode alcançar este lugar - a princípio, somente quando ele está sozinho em silêncio e na escuridão. Mas quando a necessidade de silêncio cresce, ele o procurará mesmo no meio da batalha com o eu, e o encontrará. Ele apenas não deve abandonar seu eu exterior nem seu corpo. Deve aprender a retirar-se em sua cidadela quando a batalha se torna árdua; mas precisa fazê-lo sem perder de vista a batalha; sem se permitir fantasiar que assim ele vencerá. Essa vitória só se conquista quando tudo é silêncio fora e dentro da cidadela interior. Lutando desse modo, de dentro do silêncio, o estudante descobrirá que resolveu o primeiro grande paradoxo.

Mas o paradoxo ainda o segue. Quando ele consegue retirar-se para dentro de si mesmo, ele busca lá apenas refugiar-se da tempestade em seu coração. E quanto mais ele luta para controlar as ondas de paixão e desejo, mais ele compreende que gigantescos poderes ele jurou vencer. Ele ainda se sente, quando não está em silêncio, muito parecido com as forças da tempestade. Como sua força insignificante pode competir com esses tiranos de natureza animal?

Esta pergunta é difícil de responder em palavras diretas - caso haja uma resposta para ela. Mas a analogia pode apontar o caminho onde a solução será procurada.

Ao respirar, colocamos uma certa quantidade de ar nos pulmões e, com isto, podemos imitar em pequena escala o poderoso vento do céu. Podemos produzir uma fraca imagem da natureza: uma tempestade em copo d’água, uma brisa para soprar ou mesmo afundar um barco de papel. E podemos dizer: “Eu faço isso, isso é minha respiração”. Mas não podemos soprar nossa respiração contra um furacão, menos ainda prender o vento em nossos pulmões. No entanto, os poderes do céu estão dentro de nós; a natureza das inteligências que guiam a força do mundo estão unidas à nossa natureza, e se entendermos isso e nos esquecermos de nosso eu exterior, esses ventos poderão ser nossos instrumentos.

Assim é na vida. Enquanto o homem apegar-se ao seu eu exterior - e apegar-se a cada forma que ele assume quando sua “pele mortal” é deixada de lado - ele estará tentando afastar um furacão com o sopro de seus pulmões. Tal esforço é inútil e vão; porque os grandes ventos da vida, cedo ou tarde, o dominarão. Mas se ele mudar sua atitude  dentro de si mesmo, se ele agir sabendo que seu corpo, seus desejos, suas paixões e seu cérebro não são ele mesmo - embora ele esteja a cargo deles e seja responsável por eles -;  se tentar lidar com eles como partes da natureza, então poderá ter a esperança de tornar-se uno com as grandes marés do ser,  e de alcançar, finalmente,  o lugar pacífico do autoesquecimento.

Fonte: http://www.filosofiaesoterica.com/

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Igreja São João Batista - Belém


Ela tem quase 400 anos, já foi o presídio de um dos mais importantes nomes do Brasil Colônia. É obra de um dos mais celebrados arquitetos que por aqui passaram . Virou Catedral mesmo tendo cara de capela. Foi considerada por um diretor do Louvre, como joia da arquitetura barroca. E você que vive aqui, talvez nem a conheça.


No coração da Cidade Velha, a igreja primitiva foi construída em 1622, sob o pretexto da recusa do vigário em celebrar a festa de São João Batista na única igreja então existente, a de N. Sra. da Graça.

Surgiu apenas 6 anos após a fundação da vila, em taipa e coberta de palha. Em 1661, foi cárcere do jesuíta Antônio Vieira, que cometeu o crime de dedicar-se à causa indígena. Em 1686, uma segunda igreja, surge. Em 1721, depois de ser paroquial por sete anos, vira Catedral de Belém com a criação do Bispado do Pará. Perde o posto quando a catedral da sé é concluída, na metade do século XVIII.
Após revitalização  - Frente da Igreja de São João

A igreja atual surge entre 1771 a 1774, segundo projeto do italiano Antônio Landi. Sagrada em 1777 e com sua nave octogonal coberta por uma cúpula é única em Belém.
Ainda que por fora seja quadrada, seu interior apresenta forma octogonal com elegante cúpula sobre a nave de rara beleza, o que era bastante incomum na arquitetura colonial brasileira. As pinturas do altar principal e das laterais são feitas em técnica que emita volumes e relevos.

Um conjunto tão precioso que um ex-diretor do famoso Museu do Louvre, em Paris, Germain Bazin, considerou a A Capela de São João Batista como "uma joia da arquitetura barroca".

E você que vive nesta cidade, talvez nem saiba onde ela se encontre realmente. Nunca tenha tido a curiosidade de entrar e contemplar a beleza de seus traços, a magia de quase 400 anos de história. Quando for a cidade velha de novo, não perca esta oportunidade.


Altar Mor - Estilo Barraco

Fontes: Alvo Pesquisa / Iphan / Fórum Landi, UFPa
Foto: Smith, Robert. 1937 a 1947. Coleção Robert Smith, Fundação Calouste Gulbenkian (Biblioteca Digital Fórum Landi)

sexta-feira, 13 de junho de 2014

O médico, o doente e o filósofo

O médico, o doente e o filósofo

O Médico, o Doente e o Filósofo, de Jacqueline Lagrée
Este é um livro escrito por uma professora de história da filosofia e membro da comissão de bioética de Rennes, Jacqueline Lagrée. O seu conteúdo versa sobre as particularidades da relação médico-doente, sob a perspetiva lúcida, questionadora e transformativa de um filósofo.

As palavras que introduzem esta obra pertencem ao conhecido texto do século IV, o Juramento daquele que foi médico, filósofo e revolucionador da Medicina, do seu passado até ao nosso presente – Hipócrates. Além deste conhecido filósofo são citados vários outros ao longo da obra, alguns afetados pela doença, como Pascal, que escrutinaram esta entidade sob o ponto de vista próprio do doente-filósofo. Também a ética de Spinoza e a moral de Kant são mencionados nesta obra, firmando as bases da perspetiva social deste conceito fulcral que é a doença.



“A filosofia apresentou-se durante muito tempo como uma medicina da alma”
“A doença é a paragem, o bloqueamento de um sistema no interior do todo, que impede a fluidez da vida. Mas é também a contradição em vias de ser superada. O movimento de passagem da natureza ao espírito.”


Jacqueline Lagrée inicia o seu livro mostrando claramente que há perspetivas independentes e bastante distantes umas das outras acerca da saúde e da doença. Frequentemente, o médico, o doente e os seus próximos, encaram a doença como os viajantes que, chegados ao Egipto, observam a grande pirâmide: “Cada um não capta dela senão a face pela qual ele a aborda e, em virtude de não a ter sabido contornar, crê que o seu ângulo de visão é o único e o bem”. Sob a luz de um pensamento filosófico poderemos conhecer e contornar as diferentes faces da pirâmide, melhorar a relação entre os diferentes observadores e mesmo promover um crescimento pessoal de cada um.

 A concretização desta filosofia prática observa-se no título do primeiro capítulo: “Quem é aquele que se trata?”. Um pensamento de procura da verdade inicia-se com questões fundamentais, frequentemente inquietantes, que fazem parar o movimento desenfreado da vida automática, como esta: Quem é aquele que se trata? Cada indivíduo, a dada altura, tem uma razão própria para procurar tratamento, não sendo necessariamente doente. Respondendo a esta complexa questão, a autora do livro define claramente o conceito de indivíduo: aquele “que não pode ser dividido sem ser destruído”, e o de pessoa: “o rosto, e a seguir a máscara de teatro, e, através dela, a personagem desempenhada pelos atos”. Esclarece-se, assim, que ninguém deve ser reduzido às capacidades manifestadas numa dada situação pontual. Uma pessoa é uma personagem criada na interação de máscaras. É muito mais que essa máscara, é muito mais que uma cabeça, um fígado, um rim,…, que uma bata, um bisturi ou uma receita. Um individuo é uma complexidade única, da qual só é percetível aquilo que nos é dado conhecer, e aquilo que estamos dispostos a procurar. Portanto, aquele que se trata não é apenas um doente, é uma pessoa. Esta pessoa pode, ou não, achar-se doente; pode, ou não, estar fisicamente doente. E tudo isto modifica a forma como se encara a si mesma, à doença e ao médico que procurou para se tratar. A mesma face da pirâmide pode ser observada de diferentes maneiras, por diferentes olhares.


«A doença é qualquer coisa que me acontece a mim e à qual eu reajo “provocando uma doença”»



Muito embora na generalidade dos casos seja o corpo biológico o alvo do tratamento “o corpo é, para a pessoa, o seu bem, mas um bem indisponível como o são a cidadania ou a sua liberdade”. Este corpo não é, portanto, propriedade de ninguém, nem do próprio que nele debruça a sua consciência. Não é, também, neste corpo material que radica toda a verdade e toda a ação de investigação e de tratamento. Um indivíduo, em qualquer altura, deve ser encarado no seu todo, uma vez que “a pessoa humana não se compreende senão na articulação de três planos distintos mas ligados; o plano biológico do indivíduo, (…) o plano relacional do seu ser com outrem, (…) o plano simbólico da inscrição numa cultura, numa língua, numa tradição…”. O corpo biológico, emocional, social e cultural de uma pessoa não são posse de ninguém e devem estar acima de qualquer interesse ou julgamento. Respeitando esta ideia afirma-se, de facto, a dignidade humana. A este propósito a autora cita o tratado político de Spinoza «não censurar, não lastimar, não dizer mal, mas compreender», e a segunda formulação do imperativo fundador da moral de Kant: «afirmar a dignidade da pessoa é lembrar que “eu devo tratar sempre a humanidade, na minha pessoa e na do outro como um fim em si e nunca simplesmente como um meio”», mostrando que a compreensão do indivíduo é o fim para o qual se articulam, médico e doente, por meio da medicina. Esta compreensão da pessoa mostra a existência de respeito, não só por ela, mas pelo que é o ser humano, mostra que vale a pena e eleva-a acima de todas as coisas que povoam o planeta e as mentes. A medicina é esta arte/ciência que radica na compreensão do individuo na sua total complexidade, dignificando o conceito humano. Retomando a metáfora da pirâmide, este conceito humano é a aresta que une a face da pirâmide observada por aquele que se acha doente, e a face observada pelo médico que o quer tratar, duas perspetivas diferentes encontram-se numa única linha, composta de infinitos pontos, mas bem delimitada.
O individuo que se trata é alguém que se quer conhecer a si próprio, e o indivíduo que o trata é alguém que deseja conhecer o próximo e ajudá-lo a conhecer-se a si mesmo. O encontro destes investigadores da verdade dá-se frequentemente através de uma consulta. O que é uma consulta? Segundo a autora, uma consulta é “o momento e o ato de ir consultar, isto é, tomar parecer, conselho, junto de um especialista”. Um especialista não é, portanto, algum ente solucionador de males alheios, é alguém que, por se debruçar sobre determinado assunto, pode aconselhar o seu igual, de forma a torná-lo mais lúcido e conhecedor da verdade. Alguém que procura tratar-se procura, antes de mais, esclarecer-se sobre o seu mal, estar a par dele, antes de se decidir por tratá-lo. A renúncia ao conforto da ignorância, a procura da verdade, é o que caracteriza o ato de consulta. O doente torna-se assim um filósofo, junto com o seu médico, pois ambos procuram sair das sombras, em direção à luz da verdade. A aresta da pirâmide, que une o olhar destes dois viajantes, pode começar a ser escalada, desde a sua base, junto à terra, até ao seu vértice, onde a fusão das perspetivas é perfeita. Os dois planos isolados, que se encontravam ocasionalmente numa linha, composta de infinitos pontos, transcendem-se e passam a existir e a coexistir num único e absoluto ponto.

«Quando um paciente ultrapassa o limiar do meu gabinete, é uma pessoa que entra; quando sai, é um mistério» Marie Balmary (psicanalista)


A história da Humanidade está repleta de aventurosos que procuram a solução para os mistérios da Natureza. E, tal como diz a autora, “um mistério permanece para sempre encoberto, um segredo pode-se descobrir, divulgar ou partilhar”. Médico e Doente partilham o mesmo segredo, algo privado e confidencial, a que mesmo os mais próximos não têm acesso. Ambos se reclinam sobre este segredo da natureza, procurando deslindá-lo. Nesta procura, instaura-se uma confiança inédita nas relações humanas. Algo de sagrado os une e, através deste laço, ambos partilham a mesma finalidade última, legitimando-se atos diagnósticos invasivos e tratamentos de enorme violência para o corpo.  O médico é privilegiado, como em nenhuma outra profissão, por poder realmente escutar outras pessoas. A ele se abrem as portas secretas do interior de cada um, para que possa entrar e ajudar no caminho de procura.  Aquilo que para nós é mais importante e basilar, guardamo-lo, escondemo-lo dos restantes que poderão reduzi-lo à insignificância. É através deste segredo que se respeita, onde se nega a banalidade do que se revela, que surge o “berço” da relação médico-doente. Na nossa construção metafórica piramidal, é a base da aresta que une a face do médico com a face do doente.

O doente que se expõe e partilha o seu segredo vive um momento de crise. A autora recorre novamente a Hipócrates para clarificar este conceito: “a crise é o momento singular em que o mal atinge o paroxismo e em que o tratamento adequado produzirá o efeito máximo. É o momento do discernimento, do juízo, e da decisão”. É neste preciso ponto da vida que incide a luz, que o adormecimento quotidiano cessa e há a possibilidade de evolução. Pois que, a saúde é “a vida no silêncio dos órgãos, que a doença vem perturbar”. A saúde é um sonho de liberdade e eternidade que atordoa e desvaloriza a própria vida. Perdemos noção da nossa característica efémera e frágil, perdemos as nossas prioridades, o nosso sentido na vida, a força que nos faz percorrer o nosso caminho. Adormecemos em plena caminhada, perdendo o rumo e a lucidez.“ A vida, em bom estado de saúde, é auto-justificativa: marcha normalmente por si. O estado de doença abala esta convivência espontânea com o meu corpo e o meu mundo”. Contrariamente, a crise que se instaura na doença é uma rotura, uma chamada de atenção sobre nós mesmos. Na doença o corpo torna-se uma prisão - não somos livres -, e o presente torna-se mais intenso pelo distanciamento nostálgico do passado saudável e do futuro interrompido – não somos eternos. A aparente prisão da doença, por nos mostrar a transitoriedade e mutabilidade do mundo físico, por suscitar uma rotura entre a consciência e este corpo que se rejeita, traz-nos mais para o nosso centro, para o correto ponto de vista do nosso Eu interior, que se mantém sempre o mesmo e se evidencia nesta dissociação da alma com a matéria. Frequentemente o corpo é apenas o intermediário entre a nossa vontade e o mundo onde agimos. Ele transforma aquilo que é próprio da mente e da alma em ações presentes no mundo concreto. Este corpo, quando saudável, torna fluida esta transformação, e raramente é alvo de preocupação. Temos a noção de ter tudo ao alcance de uma vontade. Quando a doença desarmoniza  este corpo, este deixa de ser transparente, para ser mais compacto e, as vontades da alma, em vez de fluírem por ele acionando-o sobre o mundo externo, esbarram nesta parede compacta. Deixamos de nos reconhecer no nosso corpo, quando doentes, perdemos a capacidade de exercer a nossa vontade, e rejeitamos esse corpo que não cumpre a sua função. Fechados num corpo que rejeitamos, o que nos resta fazer senão observar a própria alma, nunca antes observada por fugir fluida e sem atrito para o mundo concreto?


“E, no entanto, no seio mesmo da doença opera-se uma reconstrução, uma reorientação destas funções e destes processos que constituem a vida.”
“A doença é este momento crítico que pode ser estéril se todas as nossas referências se abaterem ou fecundo se nos convida a repensar a nossa vida para a viver mais intensamente ou torná-la propriamente mais nossa.”

Nesta linha de pensamentos, a autora cita Blaise Pascal, matemático francês, afetado por uma doença crónica que lhe causava grande sofrimento e que o levou a questionar as bases da vida humana: «Nunca vivemos, mas esperamos viver. E, dispondo-nos sempre a ser felizes, é inevitável que nunca o sejamos»; «Os homens não tendo podido curar a morte, a miséria, a ignorância, consideraram sensato, para se sentirem felizes, nunca pensar nisso.».

Vivemos cada minuto da nossa vida esquecendo-nos que iremos morrer. Escondemos esse facto de nós mesmos, para que, sem essa pressão de contra-relógio, possamos calmamente adiar as decisões e as ações que nos custam. A ilusão de eternidade é a cortina que nos esconde da nossa vida real. E a sentença da doença é o momento ideal para se ganhar coragem e perscrutar para além da cortina. Já não temos uma eternidade e uma infinidade de destinos a perder. Quantas vezes, no silêncio do nosso lar, inundados por infinitas possibilidades, múltiplas coisas que gostaríamos de fazer, nos deitamos a dormir. Se nos dissessem ser a nossa última noite, as dúvidas desvanecer-se-iam, pois, ínfimas são as coisas que no nosso íntimo nos fazem felizes. A doença, ao limitar-nos, é uma bênção, porque nos reorienta e imediatamente nos traz mais consciência. A nossa atenção foca-se apenas no que se passa no nosso interior, esquecendo o tumulto lá de fora. Como um caracol, na iminência de um perigo, recolhemo-nos na nossa concha interior e encontramo-nos connosco mesmos. Conhecedores de nós mesmos, podemos, pois, tornar-nos possuidores da nossa vida.

“Sabedorias antigas tomavam a peito desenvolver uma “arte de morrer” que fosse ao mesmo tempo uma purificação do medo de morrer e uma preparação para uma passagem para o além. A nossa época, ao invés, oculta tanto a dor como a morte. Parece que há no futuro qualquer coisa de insuportável e de indecente no facto de se padecer de um mal, e esconderem-se os moribundos em espaços médicos”
«Se o homem fosse uno, jamais sofreria; porque onde estaria, para este ser simples, a causa do sofrimento?» (Hipócrates)

Jacqueline Lagrée apresenta também a resposta da filosofia estoica para o sofrimento: «dor, jamais aceitarei dizer que sejas um mal!». Para os estoicos a dor física não deve ser alvo de interesse, mas apenas os males morais e as angústias da alma. Devemos dominar as nossas representações “pela distinção do que depende de nós do que não depende”. «O que perturba os homens, não são as coisas, mas os juízos relativos às coisas; assim, a morte não tem nada de assustador porque Sócrates, ele também, a teria, nesse caso, considerado como tal; mas que se julgue inquietante, isso é que inquieta. Quando, portanto, somos contrariados, perturbados, afligidos, não incriminemos nunca os outros, mas sim a nós próprios, isto é, os nossos próprios juízos. É o que sucede quando um ignorante acusa os outros dos seus próprios fracassos; aquele que começou a instruir-se acusa-se a si mesmo; aquele que é instruído não acusa ao outro nem a si.» (Manual de Epicteto).

Podemos aprender, sob a luz da filosofia estoica, a encarar o sofrimento, geralmente inerente à doença. Este tem origem nas circunstâncias externas à nossa concha interna, porque o nosso corpo e o que ele apreende do mundo externo, não somos nós, não dependem de nós, da nossa vontade e, por isso, não lhes deve ser dada importância. Devemos atender sim, à forma como apreciamos e julgamos o que nos é externo, porque isso sim, depende de nós. O sofrimento advém de sermos demasiado vulneráveis ao mundo externo em constante mudança, que nos impõe regras de como devemos ser, conforme os costumes da época. Se não tivermos um centro, em nós, como referência constante, balançamos como uma folha caída da árvore, ao sabor do vento. Somos arrastados pelos sentidos, pelas nossas representações, toldados pela dor física, arrastados pelo enfraquecimento, enfurecidos pelas emoções, cegos pelos desejos. Em nós mesmos, no nosso profundo ser, devemos procurar as respostas, e, aí, não há sofrimento, porque aí dependemos apenas de nós mesmos. Podemos ser livres, mudando a perspetiva, o enfoque, para dentro. A dor não é um mal nosso, é algo que existe fora de nós, e atendendo a ela, sofremos. Mesmo no extremo das nossas inquietações, na morte, a filosofia estoica encara-a como um chamado de deus, algo digno dos sábios: «Pode convir a pessoas felizes abandonar a vida e inversamente a infelizes manterem-se nela» - (Plutarco). Sendo a vida um caminho de aprendizagem, de procura, e tendo o sábio aprendido a lição encontrando-se, poderá, pois, morrer, tendo-se cumprindo a sua tarefa em vida.

“O estoicismo não é tanto uma aproximação da morte, mas uma meditação da vida”.

Um outro doente filósofo foi Montaigne, que descreveu a sua aprendizagem de não recear a dor e de não recear a morte: «É incerto o lugar onde a morte nos espera, esperemo-la então em todo o lado. A premeditação da morte é a premeditação da liberdade. Quem aprender a morrer, desaprendeu de servir. O saber morrer liberta-nos de toda a sujeição e constrangimento». Lembrando-nos de que podemos morrer, concentramo-nos no nosso essencial e descobrimos aí, a maior das liberdades, a liberdade da nossa alma. Aprender a morrer é assim, aprender a viver a vida interior.

«A morte não é considerada como um aniquilamento mas como uma transfiguração, uma “forma de parto de si” neste trabalho interior de fim de vida que é como uma tentativa de se entregar ao mundo antes de desaparecer» (Michel de M’uzan)

“A morte transforma a vida do homem em destino” (Malraux)

A doença, sentença de morte, pode ser, para o individuo doente, a oportunidade da prática da filosofia ativa que dará sentido à sua vida. A doença acorda o individuo do seu entorpecimento e, a medicina, tratando este individuo, permite que este tenha tempo e condições para se descobrir a si mesmo. “Cabe à filosofia, sem dúvida, lembrar-nos que somente o presente é o nosso tempo mas, em contexto de doença, cabe à medicina ajudar-nos a manter o futuro aberto, não somente mantendo uma vida desfalecida mas deixando sempre um pequeno lugar à esperança, e ao projeto.” A saúde será sem dúvida mais bela e proveitosa depois da doença.

O médico é, assim, um ajudante da transmutação alheia mas, como testemunha deste fenómeno, ele próprio encontra pistas para se descobrir a si. O agir sobre a doença é, para o médico e para o doente um ato de transformação recíproca. Porque “agir designa uma atividade em que o sujeito se produz a ele próprio na sua atividade” diferentemente do fazer ou produzir alguma coisa. Em cada doente que deposita em si a sua confiança e o seu segredo, encontra mais uma pista que mostra o caminho que tem de seguir para encontrar a verdade.

«A ciência médica é a única que não produz absolutamente nada finalmente, mas deve expressamente articular-se com esta prodigiosa capacidade da vida, a regenerar-se a ela própria e a reaprender-se a si mesma» (H. G. Gadamer)

A autora desta obra termina com a enumeração de virtudes humanas específicas que, segundo a mesma, nascem da relação triangular entre o doente, o seu médico e os que lhe são próximos:

Virtudes da inteligência:
·  Lucidez - “a coragem de olhar a verdade de frente sem querer iludir-se”.
·  Humildade - “consciência lúcida de que somos filhos da terra (húmus) antes de sermos filhos do céu”. “Compreensão da nossa finitude e aceitação da existência de limites”.
·  Fidelidade - “saber descobrir em si a linha firme e simultaneamente flexível, que permanece atrás das variações melódicas da vida”.
Virtudes da força:
·  Coragem- “capacidade de superar o medo, que separa a realidade do que se projeta sobre ela”.
·  Constância – “capacidade de permanecer fiel a si próprio, de prosseguir um projeto de vida, de defender os valores que temos por essenciais”. “Os seus frutos são a paz da alma ou ataraxia, a verdadeira coragem e a ligação ao momento presente”.
Virtudes da presença:
·  Paciência – “arte de superar o tempo, de o deixar correr afrouxando a sua captação, renunciando ao seu domínio total”. “Apenas é virtude se se acompanhar de duas atitudes: a vigilância do instante; e a preocupação consigo”.
·  Simplicidade– “amor da clareza, da inteligência que reconduz o complexo ao simples”. “Virtude da unidade de si mesmo, das suas forças e fraquezas para poder gostar de si simplesmente, sem narcisismo ou idolatria”.
Virtudes da relação:
·  Doçura– “Designa o dom da paz, a solidariedade ativa e generosa, independentemente das condições e das circunstâncias”. «Disposição de acolher outrem como alguém a quem se quer bem» - (J. de Romilly)
·  Escuta– “Dispor a orelha para ouvir. Pressupõe, para que seja eficaz, o silêncio”.
·  Solicitude– “Capacidade de ter preocupação e cuidado com o outro. Ela comporta uma parte discreta de troca e de reciprocidade”.
O que faz o laço e o alicerce de todas estas virtudes é a amizade para com o outro e para consigo mesmo. “O amigo é aquele com quem partilho pensamentos, sentimentos, gostos valores, práticas; aquele que me apoia quando falho e de quem recebo algo sem obrigação de retribuir.”

A doença não é uma maldição. É um ponto de viragem no caminho de uma pessoa que suscita um pedido de sentido em relação à vida. O médico que compreende esta pessoa, mais do que tentar explicar ou extirpar um mal, elucida um sentido, agindo sobre si próprio por colocar questões ao seu próprio caminho. Unidos nesta busca, ambos agem reciprocamente numa relação ativa e pacífica. A doença acordou-os da harmonia entorpecedora e estas duas consciências debruçam-se agora sobre cada instante da vida, pacientemente. Deste seu ponto de vista central e simples, sobre o qual todo o mundo roda e se complexifica, o objetivo é claro, o projeto de vida define-se concretamente. O que é essencial distingue-se claramente do que é supérfluo. As fundações do castelo que se quer construir, que é a própria vida, definem-se bem agora. Mas é preciso construir a obra, por em prática o projeto fielmente. 

É pois, no seio desta relação de confiança, que se estabelece o apoio e o testemunho necessários à superação do medo de falhar, do medo que sempre existe espreitando cada ação de transcendência. Fieis ao seu projeto, com os pés bem assentes na terra, ambos recebem a bênção da verdade, da lucidez que afasta as obscuridades e sombras. Ambos encontram pequenos clarões de felicidade.

A doença, se encarada como uma a pedra no caminho, utilizável para construir o nosso castelo, tal como diz Fernando Pessoa, é pois, a melhor ferramenta que podemos encontrar para nos conhecermos e para nos construirmos.

O Médico, o Doente e o Filósofo, constituem uma trindade que encara a doença sob diferentes perspetivas e que, unindo-se, transcendem-se.
Joana Moreira

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